Este texto foi adaptado do meu artigo publicado na edição 38 da Revista Shimmie.

“Dum dum taka ta dum takata”. Se você imaginou um masmoudi saghir (popularmente conhecido como “baladi”) ao ler isso, provavelmente já estudou ritmos árabes e já se deparou com toda sua beleza e toda a confusão proveniente da riqueza de variações e temperos culturais que a música árabe nos traz conforme nela mergulhamos.

Assim como é difícil entender as culturas orientais sem mergulharmos a fundo na história e na geografia do Oriente, também é difícil simplificar música sem estarmos familiarizadas com a linguagem musical. Além disso, a música árabe é essencialmente transmitida via oral de geração em geração, e na tentativa de simplificá-la e sistematizá-la, surgiram vários apelidos, notações e símbolos capazes de deixar qualquer aluna de dança do ventre de cabelo em pé.

Portanto, para estudar ritmos árabes é bastante importante contar com a ajuda de músicos profissionais ou de professoras de dança familiarizadas com os conceitos fundamentais da música. Para ajudar, este artigo fornecerá algumas dicas para iniciar seus estudos de forma mais leve e interessante, sem compromisso com o formalismo da notação musical ocidental e, contudo, sem comprometer a leitura e a escuta dos ritmos originais.

Para começar

Nos ritmos árabes, é fundamental o contraste entre graves (usualmente chamados de “dum’s”) e agudos (usualmente chamados de “tá’s”), além da duração das notas e das pausas (silêncios). Músicos árabes solfejam ritmos utilizando variações onomatopeicas do “dum” e do “tá”, e frequentemente incrementam com diversos floreios e preenchem as pausas com sons fricativos, como “S”. É importante observar que um mesmo ritmo pode ser executado com inúmeros floreios diferentes, então para efeitos de estudo, é importante restringir-se à estrutura do ritmo, ou seja, seu “esqueleto rítmico”. Desta forma, se pensarmos apenas em notas, o solfejo do masmoudi saghir (“baladi”) ficaria apenas “Dum dum tá dum tá”.

Também é de extrema importância atentar-se às pausas e aos tempos. O solfejo do exemplo acima poderia ser executado em dois, três, quatro, cinco, oito, dezesseis tempos. No caso do masmoudi saghir, executamos em quatro tempos, mas precisamos de oito “símbolos” para representarmos fielmente a relação temporal entre cada nota e as notas vizinhas.

Se representarmos uma pausa por “-” (apenas uma notação didática possível), poderíamos escrever o masmoudi como “Dum dum – tá dum – tá – “, em que o primeiro tempo é constituído pelo “Dum dum”, o segundo pelo “- tá”, o terceiro por “dum – ” e o quarto por “tá – “. Basta ler cada um dos elementos (notas e pausas) com a mesma duração.

Exercitando

Uma forma intuitiva e eficaz de inferir a contagem de um ritmo é bater palmas. Fazemos isso espontaneamente em shows de dança e música, e até mesmo em situações cotidianas, como festas de aniversário. Há, por exemplo, duas formas possíveis de cantar “parabéns a você”: em três tempos (mais comum) e em quatro tempos (aquela versão com “tchá tchá tchá” comum em igrejas e confraternizações grandes). Pratique! Identifique como sua família canta e tente cantar de outras formas, batendo palmas.

Em seguida, faça isso com músicas ocidentais de sua preferência. A maioria delas estará em três ou quatro tempos.
Quando estiver contando com facilidade, passe para as músicas árabes.

Cante o ritmo masmoudi saghir batendo quatro palmas por compasso. Em seguida, distribua igualmente oito palmas. Isso facilitará sua compreensão dos conceitos de tempo e contratempo. Tente também bater apenas duas vezes, no primeiro e no terceiro tempo. Estes são os tempos forte e semi-forte deste ritmo. Na música árabe, a dinâmica de execução dos ritmos também é muito importante. São nos tempos fortes e semi-fortes que pisamos (daí saiu a expressão “pisar no Dum”, que é válida quase sempre porque os “dum’s” costumam aparecer mais nos tempos fortes do que nos fracos) e executamos intuitivamente os movimentos de maior ênfase. Além disso, a dinâmica é importante para diferenciar, por exemplo, o masmoudi saghir (que tem quatro tempos) do masmoudi kabir (que tem oito tempos e em geral é executado em andamentos mais lentos, tem exatamente a mesma disposição temporal de notas e pausas mas sua força de execução é melhor distribuída entre os tempos do que no masmoudi saghir).

Ritmos binários (de dois tempos) como o malfuf (ou laff) e o ayoub, para serem descritos com precisão temporal sem que seja necessário utilizar a notação formal, devem ser divididos em oito partes. Procure estudá-los depois de estar completamente familiarizada com os ritmos quaternários, como o masmoudi saghir, o saiidi, o maqsoum e o wahda.

Sempre que se deparar com aquelas letrinhas confusas num exercício de snuj, respire, ouça o ritmo original com calma e foque-se em sua estrutura temporal. Acrescente os floreios somente após estar familiarizada com o “esqueleto” do ritmo.

Por fim, escute muita, muita música árabe! Só desta forma sua intuição musical ficará cada vez mais aguçada e precisa!

Com amor,

Rebeca.

Dum’s e Tak’s: Começando a estudar ritmos árabes by Rebeca Bayeh is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.